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Vida, verso e vinho

22/10/2014 06:00:46

Khayyam: sabedoria e vinho.
Khayyam: sabedoria e vinho.

Por Carlos Ávila

Folhear uma velha edição de Omar Khayyam (“Rubaiyat”, em tradução de Octavio Tarquínio de Sousa, publicada pela Ed. José Olympio, em 1948) e ali redescobrir a sabedoria, na voz e nas palavras do grande poeta persa – que foi também matemático e astrônomo.

O título – “Rubaiyat” – é o plural da palavra persa RUBAI e quer dizer “quartetos”, segundo uma pequena e esclarecedora nota no pórtico do antigo volume. Trata-se, portanto, de uma forma poética fixa (como o soneto, por exemplo): “no rubai, o primeiro, segundo e quarto versos são rimados; o terceiro é branco”.

Repetindo, é grande o prazer de redescobrir a sabedoria do poeta oriental, que foi traduzido em toda parte. A primeira edição do “Rubaiyat” que revelou Khayyam ao Ocidente foi a do poeta inglês Edward Fitzgerald (1809/1883) – há uma tradução dela, no Brasil, em edição bilíngue, realizada por Jamil Almansur Haddad; existe também outra curiosa edição no país, feita a partir da tradução francesa do orientalista Franz Toussaint (1879/1955), com os versos em português (por Manuel Bandeira) e em espanhol (por Homero Icaza Sánchez).

Khayyam foi um cantor da vida e do vinho. Segundo Tarquínio, ninguém viu melhor que Khayyam a “precariedade do destino humano, e a lição que resulta do desencanto de sua filosofia é o imediatismo”. O passado não volta, o futuro é incerto, então temos que viver intensamente o presente. Embriagar-se dele e beber um bom vinho! “Vinho cor de rubi, vinho cor de rosa, vinho cor de sangue”. Resumidamente, grosso modo, aí está o cerne dessa poesia.

Seguem algumas “pedras de toque” de Khayyam, na tradução em verso-prosa de Tarquínio (“que reflete de preferência a interpretação de Toussaint”, segundo ele):

“Procura ser feliz ainda hoje, pois não sabes o que te reserva o dia de amanhã./Toma uma urna cheia de vinho, senta-se ao clarão do luar e monologa: ‘Talvez amanhã a lua me procure em vão’.”

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“Deixemo-nos de palavras vãs./Levanta-te e dá-me um pouco de vinho./Esta noite tua boca é a mais bela rosa do mundo e basta para todos os meus desejos./Dá-me vinho./Que ele seja corado como as tuas faces, e o meu remorso será ligeiro como as tuas tranças.”

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“Os dias passam rápidos como as águas do rio ou o vento do deserto./Dois dias há, em particular, que me são indiferentes: o que passou ontem, o que virá amanhã”.

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“Quando nasci?/Quando morrerei?/Nenhum homem pode evocar o dia do seu nascimento ou prever o de sua morte./Vem, ó minha deliciosa amada!/Quero esquecer, na embriaguez, a nossa incurável ignorância”.

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“Se enxertaste no teu coração a rosa do Amor, tua vida não foi inútil, quer tenhas buscado ouvir a voz de Deus, quer tenhas empunhado a taça do prazer”.

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