Blog CULTURA

Quadrinhos ousados e criativos

17/10/2014 06:00:26

Valentina, sexy e provocante nos quadrinhos.
Valentina, sexy e provocante nos quadrinhos.

Por Carlos Ávila

Os quadrinhos (comics, nos EUA; bande dessinée, na França; fumetti, na Itália, historieta, na América latina…) são um fenômeno de massa que teve grande presença e alcance no século 20; trata-se de uma arte de consumo assim como o cinema e as canções pops. Os comics ainda continuam presentes, embora tenham se deslocado para uma espécie de segundo plano, com o advento da internet. Diversos teóricos e artistas se voltaram para os quadrinhos, como estudiosos ou admiradores: Umberto Eco e McLuhan; Picasso e Lichtenstein; Resnais e Godard. O cineasta italiano Fellini destacou,certa vez, a influência dos quadrinhos sobre seu trabalho: “Quase não li outra coisa. Se pudesse filmar Flash Gordon ou o Fantasma, seria o mais feliz dos homens”.

Os quadrinhos ganharam status de arte e mesmo de literatura – desde “Yellow Kid” e “Little Nemo”, no início do século passado, passando pelos personagens mundialmente conhecidos de Disney, até os clássicos “Flash Gordon”, “Tarzan”, “Super-homem”, “Mandrake” e “Fantasma”. Na sequência, os quadrinhos foram se sofisticando cada vez mais, em termos de ousadia e criatividade.

Recentemente a L&PM lançou um belo álbum da “Valentina”, personagem do italiano Guido Crepax (1933/2003), talvez a mulher mais sexy do universo dos quadrinhos. São quatro magníficas histórias onde o onírico se une ao erótico, em desenhos de traço fino e ágil, que utilizam graficamente alguns recursos da linguagem cinematográfica (a montagem, o corte, o close etc.). “Valentina” é inspirada na grande atriz do cinema mudo, Louise Brooks (1906/1985), principalmente no corte de cabelo; seu corpo de modelo é delicado e sensual; seu olhar, marcante. Nas histórias de “Valentina” há páginas inteiras onde o verbal é eliminado em prol da visualidade pura – recortada e detalhista.

Criada em 1965, “Valentina” ainda é atual e mesmo vanguardista, em termos de quadrinhos. O volume da LP&P traz o subtítulo “Biografia de uma personagem” – ali estão suas origens e primeiras aventuras, da infância ao nascimento de seu filho. Enriquecem a edição as notas de Luisa e Antonio Crepax – mulher e filho do autor – que esclarecem várias referências e citações, tornando mais claras histórias tão delirantes e poéticas.

Outra história em quadrinhos de impacto, bem mais recente, desta vez reunindo erotismo e violência, é “Sin City” do escritor e desenhista norte-americano Frank Miller, nascido em 1957. “Sin City – A dama fatal” (edição da Devir Editora) guarda algumas relações com a estrutura formal de “Valentina”, embora seja bem mais direta no conteúdo e menos sutil na forma – no desenho. Mas os recursos cinematográficos continuam presentes (as histórias de Miller já ganharam, com sucesso, as telas dos cinemas, inclusive em 3D!), assim como a eloquência visual que muitas vezes elimina o verbal, ou o mantém apenas com onomatopeias.

O cenário de “Sin City” é um mundo urbano e sombrio (há algo nele de “Blade Runner”), que causa algum estranhamento, com homens “derrotados” e mulheres barra-pesada (fatais e mortais). Trata-se de um ambiente “abafado”, que abre espaço para ações transgressoras e agressivas; há também um clima de policial noir, com personagens descontrolados e situações patéticas. “Sin City” atrai toda uma nova geração e mostra que os quadrinhos continuam vivos e com vitalidade criativa.

Comentários